segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Dona Doida



" Uma vez , quando eu era menina ,

choveu grosso , com trovoadas e

clarões , exatamente como chove

agora .

Quando se pôde abrir as janelas ,

as poças tremiam com os últimos pingos .

Minha mãe , como quem sabe que vai

escrever um poema , decidiu inspirada :

chuchu novinho , angu , molho de ovos .

Fui buscar os chuchus e estou voltando

agora , trinta anos depois .

Não encontrei minha mãe .

A mulher que me abriu a porta ,

riu de dona tão velha ,

com sombrinha infantil e coxas à mostra .

Meus filhos me repudiaram envergonhados ,

meu marido ficou triste até a morte ,

e eu fiquei doida no encalço .

Só melhoro quando chove ."


Adélia Prado

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