terça-feira, 31 de maio de 2011
Oferenda
“ Poesia é o que posso te oferecer
como um pouco de tempo claro
no fundo do tacho
como uma estrela de água
escuta : os pássaros foram a tarde
com seus invisíveis anseios
caminha com cuidado
o chão está armado
em cima de horizontes
tudo pode ruir de repente
essa casa de vento
meu coração .”
Roseana Murray
domingo, 29 de maio de 2011
sábado, 28 de maio de 2011
Medo
“ eu tenho um medo . guardado na gaveta de baixo .
bem no fundo . com corrente e cadeado .
eu tenho um medo trancado .
debaixo das revistas velhas .
dos cadernos usados.
dos livros já lidos . dos papéis amarrotados .
eu tenho um medo escondido . pior que de escuro ,
lugar alto , homem do saco . um medo segredo.
o mesmo , desde pequeno . desde a oração cochichada.
da febre sob as cobertas .
do sinal da cruz no meio da noite .
o mesmo desde sempre . um medo que me persegue .
me atormenta . me atrapalha .
que aparece no canto do quarto .
no abrir dos armários . em vulto pelos corredores .
em visão pela casa vazia .
miragem pela praia deserta . ruído no meio do silêncio .
grito no meio da madrugada . eu tenho um medo morto .
ressuscitado . um medo tantas vezes enterrado .
mas que sempre volta . que cava a terra ao contrário .
para acabar comigo e ser mais uma vez trancado .
escondido na gaveta de baixo . com corrente e cadeado .
um medo que sempre escapa . foge .
eu tenho um medo que sempre espera minha chegada .
sorrindo . bem no meio da sala .”
Eduardo Basczyn
sexta-feira, 27 de maio de 2011
Canção
“ No desequilíbrio dos mares ,
as proas giram sozinhas ...
Numa das naves que afundaram
é que certamente tu vinhas .
Eu te esperei todos os séculos
sem desespero e sem desgosto ,
e morri de infinitas mortes
guardando sempre o mesmo rosto.
Quando as ondas te carregaram
meus olhos , entre águas e areias ,
cegaram como os das estátuas ,
a tudo que existe alheias .
Minhas mãos pararam sobre o ar
e endureceram junto ao vento ,
e perderam a cor que tinham
e a lembrança do movimento.
E o sorriso que eu te levava
desprendeu-se e caiu de mim :
e só talvez ele ainda viva
dentro destas águas sem fim .”
Cecília Meireles
quinta-feira, 26 de maio de 2011
Citação do dia ...
quarta-feira, 25 de maio de 2011
Vivência
terça-feira, 24 de maio de 2011
Rezar ...
“ Meu Deus , e eu que não sei rezar ?
Como viver então ?
Não é só para pedir por mim e por outros ,
mas para sentir , para agradecer ,
para de algum modo entrar num convento ,
logo eu que sou tão católica e feroz .
Existe uma cartomante que me conheceu mocinha .
E agora é ela quem me chama
e não me cobra nada .
Apesar de cartomante é profundamente católica.
E tem ido à missa por mim .
Obrigada por rezar o que eu não sei .
Oh Deus , eu já fui muito ferida .
Mas a quanta gente tenho pelo que agradecer .
Só não cito os nomes para não ferir
o pudor de quem eu citasse .
Tenho recebido olhares que valem por uma reza .
E há quem já tenha feito promessa por mim .
E eu ? Vou tentar rezar agora mesmo ,
despudoradamente em público .
É assim : Meu Deus - não , é inútil , não consigo .
Mas talvez dizer “ Meu Deus “ já seja uma reza .
Há , porém um pedido que devo fazer e farei agora
mesmo : Deus , fazei com que os que eu amo não
me sobrevivam , eu não toleraria a ausência .
Pelo menos isso eu peço .”
Clarice Lispector
segunda-feira, 23 de maio de 2011
domingo, 22 de maio de 2011
Vou-me embora pra Pasárgada
“ Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Terei a mulher que quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau- de- sebo
Tomarei banhos de mar !
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
- Lá sou amigo do rei –
Terei a mulher que quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada ."
Manuel Bandeira
sábado, 21 de maio de 2011
Formigas
sexta-feira, 20 de maio de 2011
Riobaldo dizia :
“ Contar é muito dificultoso .
Não pelos anos que já se passaram.
Mas pela astúcia que tem certas coisas
passadas de fazer balancê ,
de se remexerem dos lugares .
A lembrança da vida da gente se guarda
em trechos diversos ; uns com os outros
acho que nem não se misturam .
Contar seguido , alinhavado , só
mesmo sendo coisas de rasa importância .
Tem horas antigas que ficaram perto da gente
do que outras de recente data .
Toda saudade é uma espécie de velhice .
Talvez , então , a melhor coisa seria contar
a infância não como um filme em que a
vida acontece no tempo , uma coisa depois
da outra , na ordem certa , sendo essa conexão
que lhe dá sentido , princípio , meio e fim ,
mas como um álbum de retratos , cada um completo
em si mesmo , cada um contendo o sentido inteiro .
Talvez seja esse o jeito de escrever sobre
a alma em cuja memória se encontram as coisas
eternas , que permanecem ...”
Guimarães Rosa , in " Grande Sertão Veredas "
quinta-feira, 19 de maio de 2011
Mais Lygia Fagundes Telles ...
Citação de hoje ...
quarta-feira, 18 de maio de 2011
Nascimento
(...) “ O nascimento é uma felicidade coletiva ,
somos de fato todos irmãos , tão parecidos uns
com outros .”
(...) “
Se fosse homem seria Felipe .
Felipe . Um belo nome .
Nítido como um cavaleiro recortado contra o horizonte.
Um nome com contornos definidos .
Uma dignidade simples , auto-evidente .
Repete o nome várias vezes , quase em voz alta ,
para conferir se ele não se desgasta pelo uso ,
se não se esfarela no próprio som , esvaziado pelo
eco : Felipe , Felipe ,Felipe , Felipe .
Não : mantém-se intacto no horizonte, firme sobre
o cavalo , a lança na mão direita .”
Cristóvão Tezza , in “ O filho eterno “
Hoje a página é para meu filho , Felipe ,
que comemora conosco mais um ano de vida.
Parabéns !!!
Beijos .
Saúde , sucesso , alegria e muito amor ,
com as bênçãos de Deus .
terça-feira, 17 de maio de 2011
Poesia , sempre ...
“ Na primeira noite
eles se aproximam
e colhem uma flor
de nosso jardim.
E não dizemos nada .
Na segunda noite ,
Já não se escondem :
pisam as flores ,
matam nosso cão ,
e não dizemos nada .
Até que um dia
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa ,
rouba-nos a lua e ,
conhecendo nosso medo ,
arranca-nos a voz da garganta .
E porque não dissemos nada ,
Já não podemos dizer nada .”
Eduardo Alves da Costa
segunda-feira, 16 de maio de 2011
Poema de hoje ...
domingo, 15 de maio de 2011
Rubem Alves , ainda...
“ Foi longo o itinerário que segui .
Minha infância foi uma infância feliz .
Vivi anos de pobreza , morando numa
casa de pau-a-pique ,fogão de lenha ,
noites iluminadas pela luz das lamparinas
e das estrelas , minha mãe trazendo
água da mina numa lata , meu pai
trabalhando com a enxada e o machado.
Mas não tenho desses anos nenhuma
memória triste . As crianças ficam felizes
com pouca coisa ( ...)
O sagrado aparecia , sem nome , no capim,
nos pássaros , nos riachos , na chuva ,
nas árvores , nas nuvens , nos animais .
Isso me dava alegria .”
Rubem Alves ,na crônica
“ A beleza dos pássaros em vôo ...”
Outras confissões de Rubem Alves
“ Meu filho Sérgio tinha três anos quando viu
o mar pela primeira vez .
Em silêncio , ficou a contemplar o mar ,
as ondas se quebrando sem cessar .
E me perguntou : “ O que é que o mar faz
quando a gente vai dormir ?”
Era-lhe incompreensível a eternidade do mar.
Também me espanto e me pergunto , sem resposta :
“ Há quanto tempo o mar se quebra alisando a areia ? “
O mar , a praia , as conchas , o céu , os peixes
invisíveis nas profundezas , as gaivotas em vôo
me falam da eternidade .
Senti-me retornado ao início do mundo ( ...) “
Rubem Alves ,
na crônica “ Por que não me mudo pra Bahia “
sábado, 14 de maio de 2011
ÉTICA DA ALEGRIA
( ...)
“ A ética não é um código , mas uma perspectiva
para a reflexão prática sobre nossas ações .
A ética consiste em pôr nossa liberdade a serviço
da camaradagem vital que nos aparenta com
nossos semelhantes em desespero e alegria ...
Sustentar-se na alegria é o equilibrismo mais árduo ,
mas o único capaz de conseguir com que todas
as penas humanas valham de fato a pena .
A isto chamamos ética : penar alegremente .”
Fernando Savater , in” Desperta e Lê “
Confissões de Rubem Alves
sexta-feira, 13 de maio de 2011
Amor Violeta
Vitral ...
“ A vida se retrata no tempo
formando um vitral ,
de desenho sempre incompleto ,
de cores variadas ,
brilhantes ,
quando passa o Sol .
Pedradas ao acaso
acontece de partir pedaços
ficando buracos ,
irreversíveis .
Os cacos se perdem
por aí .
Às vezes eu encontro
cacos de vida
que foram meus ,
que foram vivos .
Examino-os atentamente tentando lembrar
de que resto faziam parte .
Já achei caco pequeno e amarelinho
que ressuscitou
de mentira , um velho amigo .
Achei outro pontudo e azul ,
que trouxe em nuvens
um beijo antigo .
Houve um caco vermelho
que muito me fez chorar ,
sem que eu lembrasse
de onde me pertencera .”
Maria Antônia de Oliveira
quarta-feira, 11 de maio de 2011
Um dia ...
“ Penso sempre que um dia a gente vai se encontrar
de novo , e que então tudo vai ser mais claro ,
que não vai mais haver medo nem coisas falsas .
Há uma porção de coisas minhas que você não sabe ,
e que precisaria saber para compreender todas as vezes
que fugi de você e voltei e tornei a fugir .
São coisas difíceis de serem contadas ,mais difíceis
talvez de serem compreendidas ,se um dia a gente
se encontrar de novo ,em amor , eu direi delas ,
caso contrário,não será preciso .
Essas coisas não pedem resposta nem ressonância
alguma em você:eu só queria que você soubesse
do muito amor e ternura que eu tinha - e tenho- pra você .
Acho que é bom a gente saber que existe desse jeito em
alguém , como você existe em mim .”
Caio Fernando Abreu
terça-feira, 10 de maio de 2011
Primeiro aniversário
Sempre guardei , em cadernos ,
poemas que gostava , trechos de livros ,
crônicas e artigos de jornais .
Os cadernos funcionavam como um baú
de coisas queridas .
Há um ano , através deste blog ,
resolvi repartir com os amigos , meus guardados .
E , para celebrar este primeiro aniversário ,
coloco , uma vez mais , o belo poema ,
“ Guardar “ , de Antonio Cícero , que
exemplifica o que pretendi e o que
me faz muito bem .
“ Guardar uma coisa não é
escondê-la ou trancá-la .
Em cofre não se guarda coisa alguma .
Em cofre perde-se a coisa à vista .
Guardar uma coisa é olhá-la , fitá-la ,
mirá-la por admirá-la , isto é ,
iluminá-la ou ser por ela iluminado .
Guardar um coisa é vigiá-la , isto é ,
fazer vigília por ela , isto é ,
velar por ela ,isto é , estar acordado por ela ,
isto é ,estar por ela e ser por ela .
Por isso , melhor se guardar o vôo de
um pássaro do que um pássaro sem vôos.
Por isso se escreve ,
por isso se diz , por isso se publica ,
por isso se declara e declama um poema :
para guardá-lo:
para que ele , por sua vez , guarde
o que guarda :
guarde o que quer que guarda um poema:
por isso o lance do poema :
por guardar-se o que se quer guardar .”
Obrigada pelas visitas ,
pelo incentivo , e , sobretudo ,
pelo carinho .
Beijos,
Marisa
domingo, 8 de maio de 2011
Dia das mães
“ A maternidade , à semelhança da arte ,
é como encostar o ouvido na porta
fechada sobre o mistério .
Sentimos ternura e medo quando esta
nova criatura domina a nossa vida ,
inunda os espaços , tolhe a liberdade ,
colhe os frutos do tempo e da paciência
e no entanto não poderíamos viver
sem ela .
Passaremos o resto da vida aprendendo
como não ser tão dependentes desse
novo ser , aprendendo a torná-lo livre de
nós : único , senhor de seu caminho ,
e dono de suas escolhas .
Porque só assim poderemos inventar
um amor que , por não sujeitar ,
nos reafirma .”
Lya Luft
Parabéns a todas as mães !!!
Beijos ,
Marisa
sexta-feira, 6 de maio de 2011
Citação do dia ...
quarta-feira, 4 de maio de 2011
Poema de hoje
“ Agora escrevo pássaros .
Não os vejo chegar , não escolho ,
de repente estão aí ,
um bando de palavras
a pousar
uma
por
uma
nos arames da página ,
entre chilreios e bicadas ,
chuva de asas ,
e eu sem pão para dar ,
tão somente deixo-os vir .
Talvez seja isto uma árvore ,
ou quem sabe , amor . “
Júlio Cortázar , in “ Para Cris “
segunda-feira, 2 de maio de 2011
domingo, 1 de maio de 2011
Primeiro de maio : dia do trabalho
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